terça-feira, 23 de setembro de 2014

O Punk do Séc. XVIII

Da música barroca pouco conhecia, ou não identificava, até ter que escrever uma pequena peça sobre a Orquestra Barroca da Casa da Música para a revista GO Mag, da GrandOptical, onde a curiosidade se despertou, sobretudo para o contexto em que esta surgia. A orquestra do Porto formou-se em 2006 e tinha como fundamento a interpretação deste género numa perspectiva historicamente informada e, por isso, os instrumentos são assemelhados com os utilizados nos séc. XVII e XVIII, sendo o oboé e o fagote os mais distintos, para que a sua música seja o mais fiel possível à sonoridade com que compositores como Bach, que inspira grande parte dos concertos desta orquestra, criaram a música barroca. Mas o que é que inspirou os grandes músicos da época?

Talvez o puro conhecimento musical seja o mote para esta orquestra, mas a sua música não deixa de me transportar para um ambiente caracterizado pelas grandes contendas entre antigas nações, com corsários, piratas e marqueses como peões no intrincado enredo da história de países como Portugal, Inglaterra, Espanha e Holanda, em guerras que se eternizaram na história por causa das colónias sul e norte americanas e africanas, onde a religião tinha um peso inegável. Foi uma época em que a ciência e a filosofia acordavam para um novo impulso, a adivinhar a chegada do iluminismo.

Esse contexto teve um peso inquestionável na música dos séc. XVII e XVIII, a reflexão levava-os a expressar toda a magnitude deste novo despertar da humanidade depois de longos séculos de trevas na sabedoria. As origens do nome barroco são obscuras, poderão vir do português antigo, do espanhol ou até do árabe, mas quer dizer "pérola irregular”, o que explica o estilo ornamentado nas Artes Plásticas ou na Arquitectura, mas na música, naquela época, era um termo depreciativo que quase a identificava como grotesca, assim como foram identificados todos os géneros musicais vanguardistas que realmente fizeram história. Penso que esse seja o facto que mais me fascina neste género: hoje tomamo-lo como clássico, até enfadonho de tão erudito que é, mas um dia foi a vanguarda da música, composta pelos músicos proscritos, foi o punk do séc. XVIII !!


O alaúde, percursor do bandolim, o cravo, anterior ao piano, e a lira, um familiar mais humilde do violino, são os instrumentos mais emblemáticos deste género.

Culturalmente mais associado a terras francesas e italianas, em Portugal é muito bem representado pela direção de Laurence Cummings, maestro titular da Orquestra Barroca da Casa da Música, que terá garantidamente aspirado a esta magia de tempos de ascensão para apresentar uma orquestra tão rica, que conta muitas vezes com vários maestros e solistas reconhecidos, como Rinaldo Alessandrini, Harry Christophers, Andreas Staier e Roberta Invernizzi e agrupamentos como The Sixteen ou o Coro Casa da Música.
  

Este ano interpreta obras bem conhecidas de Händel, Rameau, Monteverdi, Vivaldi, Corelli e Lully, entre outros compositores, e associa-se ao Ano Oriente na Casa da Música, lavada também pelo feitiço das turqueries na corte do Rei Sol, deixando claro que estamos perante uma orquestra de rigor histórico com inspiração na eternidade.

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